23.1.10

No Staatstheater

Depois de passarmos o vestíbulo minimalista e clean, atravessámos a porta dos bastidores. Gente a andar de um lado para o outro, cada porta um submundo. Seguimo-la por corredores intermináveis e labirínticos. Ela andava depressa, eu queria ver o que havia atrás das portas. Queria espreitar para a sala onde vi roupa pendurada em cabides. Ela apercebeu-se da curiosidade e disse com indiferenca que salas dessas havia muitas ali. Num dos corredores, vimos instrumentos musicais, tambores e xilofones gigantes. Era a sala de ensaios da orquestra. E nós andávamos depressa demais.

No quarto andar fica a Damenschneiderei*, onde trabalham quase vinte modistas. Uma sala sobre o comprido, com mesas em fila junto dos janeloes e vista sobre a cidade. A parede é forrada de caixas em prateleiras com botoes, fechos, fitas, galoes e catálogos com amostras de tecido. Em cada caixa uma etiqueta escrita à mao em letra desenhada. Um par de trabalhos por acabar enrolados em manequins pretos de veludo. Máquinas de costura. Posters de mulheres na parede. A Marilyn Monroe de vestido branco a voar em Nova Iorque. Estamos sozinhas ali, é tarde e as costureiras já foram para casa. Lá fora está escuro, nao se ouve um som, estamos sozinhas no mundo. A melhor maneira de tomar decisoes. A costureira tem ar de menina, nao lhe consigo dizer a idade. Talvez quarenta. Muito calma, pequenina, elegante. Usa uma saia escura rodada e botinhas pelo tornozelo. Mostra-nos sedas, organzas e rendas. Rendas tao finas e suaves. Etéreas. Deixa-nos tempo para mexermos nas amostras. Fala pouco. Mede a altura da noiva. Para um vestido sao três vezes a altura. Ela nao sabe desenhar, gesticula as ideias num manequim de veludo preto. As mangas, que podem ser cortadas um pouco para dentro das costas, o bolero em seda a terminar pela altura da fita do vestido.

Imagino-me a trabalhar numa sala com janelas grandes e sem computadores. Conhecer o conteúdo das caixas na parede, os tecidos pelo toque e como se faz uma saia mais rodada atrás que à frente. Mover-me aqui como em casa. Pelos corredores labirínticos sem fim. Imagino-me a fazer um trabalho manual assim, do qual se vê o resultado. E o resultado é beleza.

*Oficina de modistas

3 comentários:

Anônimo disse...

Adoro estas descrições do universo feminino! Mais! Quero mais! Beijos, branquinha

leo disse...

Beijos também para ti, querida Branca.

Madame Couscous

Anônimo disse...

um mundo mágico!
adorei